As siglas
poveiras ou marcas
poveiras são uma forma de "proto-escrita primitiva",
tratando-se de um sistema de comunicação visual simples usado na
Póvoa de Varzim durante séculos, em especial nas classes
piscatórias. Para se escrever usava-se uma navalha e eram escritas
sobre madeira, mas também poderiam ser pintadas, por exemplo, em
barcos ou em barracos de praia.
No passsado, era também usado
para recordar coisas; eram conhecidas como a «escrita» poveira, mas
não formavam um alfabeto, funcionando tal como a escrita egípcia -
os hieroglifos (constituem imagens de objectos: Sarilho, Coice,
Arpão, Pé de Galinha, Grade, Lanchinha, Calhorda, Pêna, etc.). Esta
escrita era usada porque muitos pescadores eram desconhecedores do
alfabeto latino, e assim as siglas adquiriram bastante
utilidade.
As marcas estão nas redes, nas
velas, nos mastros, paus de varar, nos lemes, nos bartidoiros, nos
boireis, nas talas, nas facas da cortiça, nas mesas, nas cadeiras,
em todos os objectos que lhe pertençam, quer no mar, na praia ou em
casa. A marca num objecto equivale ao registo de propriedade. O
Poveiro lê essas marcas com a mesma facilidade com que nós
procedemos à leitura do alfabeto.
Herança da
Marca
As siglas são brasões de
famílias hereditários, transmitidos por herança de pais para
filhos, têm simbolismo e só os herdeiros podem usar. O filho mais
novo herdava a sigla do pai enquanto que os outros filhos herdavam
a mesma sigla com com um ou mais "piques". Assim, o filho mais
velho tem um pique, o segundo dois, ... Existiam vários modos de
colocar os piques na sigla, desde picar, gradar até cruzar a marca.
Formando-se assim, conforme o número de piques, cruzes, estrelas ou
grades.
Na tradição poveira, que ainda
perdura, o herdeiro da família é o filho mais novo tal como na
antiga Bretanha e Dinamarca. O filho mais novo é o herdeiro dado
que é esperado que tome conta dos seus pais quando estes se
tornassem idosos. O Poveiro, ao chegar à meia idade, dava o lugar
na lancha ao filho mais novo, que lhe tomava conta da rede e
aprestos sinalados.
Para as gerações seguintes, a
dos netos, a regra é idêntica. Estes têm para além dos seus piques,
os piques na marca do pai, caso nenhum dos dois seja o filho mais
novo.
O Poveiro, ao casar-se,
registava a sua marca na mesa da sacristia da Matriz, gravando-a
com a faca que lhe servia para aparar a cortiça das redes. A mesa
da sacristia da velha igreja da Misericórdia, que serviu de Matriz
até 1757, tinha gravadas milhares de marcas, representando um
precioso documento para estes estudos.
Infelizmente, essa mesa
desapareceu com a demolição deste Igreja sem que dela ficasse o
menor vestígio ou documento fotográfico. Contudo, ainda se vêm hoje
algumas gravações destas marcas nas mesas das sacristias da actual
Matriz e da Igreja da Lapa.
Os vendedores analfabetos
serviam-se das marcas para saberem de quem era a conta fiada. E
assim, antes da rodelas e riscos com que designavam os vintens e
tostões, pintavam a marca do devedor.
Nas suas arribadas à costa
norte, os Poveiros gravavam nas portas das capelas mais destacadas
nos areais ou montes a sua marca como documento da sua passagem por
ali. Algumas dessas capelinhas conservam ainda as suas antigas
portas cobertas de marcas poveiras.
Mas não era só nas arribadas
que o Poveiro assinalava a sua passagem com a marca. Nos Mosteiros
ou capelas onde fosse cumprir uma promessa, normalmente quando ela
era feita em nome colectivo, isto é, da companha, gravava nas
portas dos templos, nas mesas das sacristias, nas cercaduras em
madeira, nos arcos cruzeiros, a sua marca, que assim servia de
testemunho perante a grei do cumprimento da sua promessa. Eram bem
marcas votivas.
É corrente entre eles que os
velhos poveiros analfabetos, em lugar de assinarem em cruz nos
documentos públicos, faziam a sua marca, que era o equivalente à
sua assinatura. Poucos documentos comprovam esta afirmação. Apenas
nas actas da velhas Associação Marítima dos Poveiros, relativamente
moderna, encontramos essa sinalização. |
The siglas
poveiras (also known as marcas or marks) is a proto-writing system that
has been used by the local community of Póvoa de Varzim in Portugal
for many generations. The siglas were primarily used as a signature
for family coat-of-arms in order to mark family belongings. The
symbols were normally written using a razor on wood, but painting
on boats and beach sheds was also common.
The purpose of the siglas was to record history and thus has been
ascribed as Póvoa's "writing system". However, the siglas do not
form an alphabet, but rather are of a similar nature as Egyptian
hieroglyphs. The reason for their prominence has been ascertained
due to the lack of knowledge of the residents of the Latin
alphabet.
These marks can be found in the nets, in the boats, in the knifes,
in the tables, and in many other personal sea, beach or home
objects. The mark in an object is the same as the registration of
property. The Poveiros can read this marks with the same ease
as we can read the alphabet.
Inheritance
The siglas are hereditary Coat-of-Arms, transmitted by inheritance
from fathers to sons. These have unique symbolism and only the
heirs are allowed to use them.
The siglas were not simply invented, but passed on through
generations. The base family sigla was passed from the father to
the youngest son — in Póvoa de Varzim’s tradition, the
heir of the family is the youngest son — to the other
children was given the sigla with a trace (the pique). Thus, the
eldest son would have one pique, the second two and so on, until
the younger son that would have the original sigla, inheriting the
same symbol as his father.
Analyses were made to check if families have actually used the same
symbols throughout generations, due to some supposed
inconsistencies within some families. It became apparent that the
inconsistencies had historical or genealogical motivations, and
that these symbols were inherited through generations and preserved
as part of Póvoa's local traditions. Hundreds of different marks
were studied leading to 84 different original families.
The Poveiros wrote their sigla in the table of the mother church
upon marriage, as a way for recording the event. This usage of
siglas can still be found in Igreja Matriz of Póvoa de Varzim (the
mother church since 1757) and in Igreja da Lapa.
A table in the old Church of Misericórdia that had the function of
a mother church until 1757 kept thousands of siglas, the obtainment
of which would aid in a deeper study of the siglas poveiras, but
these were destroyed when the church was demolished.
Useful places for the study of Siglas Poveiras are the religious
temples located not only in the city and its rural area, but also
in all the Northwest of the Iberian Peninsula, especially in the
Minho region (in Portugal) and in Galicia (Spain).
The Poveiros, throughout generations, used to make inscriptions in
the doors of chapels close to beaches or hills as a journey mark or
as "campaign promisses" (promessas de campanha). This has been
observed in Nossa Senhora da Bonança in Esposende's beach, and
Santa Trega in La Guardia Hill, Spain. The mark inscribed would
serve as a marker for the Poveiros that would come later indicating
either the passage of the inscriber or the attempts to procure good
luck from the venerated saint of that place. |