A extensa área aplanada que hoje é a várzea da Cela/Valado dos Frades e da Maiorga, ladeada a ocidente pela Serra da Pescaria e a oriente pelas colinas do Bárrio, foi em tempos ocupada por uma ria que progressivamente se transformou num estuário lagunar, designada por Lagoa da Pederneira.
As zonas que flanqueavam esta Lagoa terão sido povoadas desde o Paleolítico e ao longo do Neolítico. São abundantes os achados arqueológicos do Neolítico, bem como da ocupação romana, na periferia do limite da Lagoa da Pederneira, sobretudo nos bancos mais interiores, como Valado, Cós, Maiorga, Fervença, Cela e Famalicão. As sucessivas ocupações humanas destes períodos são praticamente coincidentes em termos de localização, e delimitam uma superfície imersa indicando que neste troço litoral a superfície terá permanecido pouco alterada até há cerca de 2000 anos atrás. Apesar do assoreamento natural, as principais transformações morfológicas parecem ser posteriores, com grande responsabilidade para a actividade antrópica.
A ocupação visigótica da região (séc. VII) está documentada por várias torres que marginavam a laguna, localizadas estrategicamente para a defesa e sinalização das áreas onde provavelmente funcionavam pequenos portos. Os documentos do século XIII referem ainda o acesso por barcos aos portos de Fervença e da Pederneira, que os monges de Alcobaça utilizavam para exportação de sal. No século XIV, a área entre a Mata da Torre, Valado dos Frades e S. Bartolomeu seria ainda coberta por água salgada, formando uma lagoa já bem mais reduzida, em comunicação com o mar por uma barra (associada a uma barreira) situada no estrangulamento da Ponte da Barca ou talvez mais a jusante, a norte do Cafurno.
Apesar dos problemas de assoreamento desta barra se encontrarem bem documentados desde o séc. XIV, o porto da Pederneira tinha, nesta altura, grande desenvolvimento e importância económica que se prolongou ao séc. XV. A partir desta data o seu declínio foi rápido, devido ao intenso assoreamento resultante da expansão da agricultura em toda a área dominada pelo Mosteiro de Alcobaça. Esta actividade fazia-se à custa da destruição de parte das florestas e matos, o que muito acelerou a erosão. Os detritos resultantes, transportados pela rede hidrográfica, depositaram-se nas baixas adjacentes, entulhando o leito e a foz dos rios.
Em finais do século XVI, o primitivo porto interior de águas calmas foi mudado para a “praia da enseada de Nossa Senhora de Nazareth” (“porto da vila da Pederneira”). Por esta altura, o porto funcionaria no abrigo do promontório do Sítio e da arriba da Pederneira e a barra situar-se-ia em frente à Pederneira, cerca de 800m a sul do Sítio, permitindo a passagem apenas a pequenos barcos que ainda subiam ao longo do rio Alcoa. Em meados do século XVIII e princípios do século XIX, o problema da inundação das áreas adjacentes agravou-se com o declínio da Abadia de Alcobaça. Com a instabilidade vigente, a limpeza dos rios e das valas de drenagem deixou de ser feita, bem como a manutenção da barra. O que veio provocar o progressivo assoreamento que conduziu à colmatação total desta baixa no séc. XX.
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